Corpus Christi
Na quinta-feira, após a solenidade da Santíssima Trindade, a Igreja celebra devotamente a solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo, festa comumente chamada de Corpus Christi.
A motivação litúrgica para tal festa é o louvor merecido à Eucaristia, fonte de vida da Igreja. Desde o princípio de sua história, a Igreja devota à Eucaristia um zelo especial, pois reconhece neste sinal sacramental o próprio Jesus, que continua presente, vivo e atuante em meio às comunidades cristãs.
Celebrar Corpus Christi significa fazer memória solene da entrega que Jesus fez de sua própria carne e sangue, para a vida da Igreja, e comprometer-nos com a missão de levar esta Boa Nova para todas as pessoas.
Origem
Uma primeira coisa a saber é que não existe registo do culto ao Santíssimo Sacramento fora da Missa no primeiro milênio. Nesse período, a Eucaristia ministrada fora da Missa era somente para os doentes. Na Idade Média, o costume de celebrar a missa com as costas voltadas para o povo, foi criando certo mistério em torno da Eucarística. Todos queriam saber o que acontecia no altar, entre o padre e a hóstia. Para evitar interpretações de ordem mágica e sobrenatural da liturgia, a Igreja foi introduzindo o costume de elevar as partículas consagradas para que os fiéis pudessem olhá-la.
A partir do segundo milênio, no entanto, por meio de um movimento eucarístico, cujo centro foi a Abadia de Cornillon, fundada em 1124, pelo Bispo Albero em Liége, na Bélgica, podemos constatar costumes eucarísticos: exposição e bênção do Santíssimo Sacramento, o uso dos sinos durante sua elevação na Missa e, consequentemente, a festa do Corpus Christi.
A Solenidade em honra ao Corpo do Senhor — “Corpus Chisti” –, que hoje celebramos na quinta-feira após a oitava de Pentecostes, mais precisamente depois da festa da Santíssima Trindade, é oficializada somente em 1264 pelo Papa Urbano IV.
Como bem sabemos, Deus costuma se revelar aos humildes e pequenos, e Ele se utilizou de uma simples jovem para lhe revelar a festa de Corpus Christi. Segundo os registros da Igreja, Santa Juliana de Cornillon, em 1258, numa revelação particular, teria recebido de Jesus o pedido para que fosse introduzida, no Calendário Litúrgico da Igreja, a Festa de Corpus Domini.
Santa Juliana nasceu, em 1191, nos arredores de Liège, na Bélgica. Essa localidade é importante, e, naquele tempo, era conhecida como “cenáculo eucarístico”. Nessa cidade, havia grupos femininos generosamente dedicados ao culto eucarístico e à comunhão fervorosa.
Tendo ficado órfã aos cinco anos de idade, Juliana, com a sua irmã Inês, foram confiadas aos cuidados das monjas agostinianas do convento-leprosário de Mont Cornillon. Mais tarde, ela também uma monja agostiniana, era dotada de um profundo sentido da presença de Cristo, que experimentava vivendo, de modo particular, o Sacramento da Eucaristia.
Com a idade de 16 anos, teve a primeira visão. Via a lua no seu mais completo esplendor, com uma faixa escura que a atravessava diametralmente. Compreendeu que a lua simbolizava a vida da Igreja na Terra; a linha opaca representava a ausência de uma festa litúrgica, em que os fiéis pudessem adorar a Eucaristia para aumentar a fé, prosperar na prática das virtudes e reparar as ofensas ao Santíssimo Sacramento.
Durante cerca de 20 anos, Juliana, que entretanto se tinha tornado priora do convento, conservou no segredo essa revelação. Depois, confiou o segredo a outras duas fervorosas adoradoras da Eucaristia: Eva e Isabel. Juliana comunicou essa imagem também a Dom Roberto de Thorete, bispo de Liége. Mais tarde, a Jacques Pantaleón, que, no futuro, se tornou o Papa Urbano IV. Quiseram envolver também um sacerdote muito estimado, João de Lausanne, pedindo-lhe que interpelasse teólogos e eclesiásticos sobre aquilo que elas estimavam.
Foi precisamente o Bispo de Liége, Dom Roberto de Thourotte, que, após hesitações iniciais, aceitou a proposta de Juliana e das suas companheiras, e instituiu, pela primeira vez, a solenidade do Corpus Christi na sua diocese, precisamente na paróquia de Sainte Martin. Mais tarde, também outros bispos o imitaram, estabelecendo a mesma festa nos territórios confiados aos seus cuidados pastorais. Depois, tornou-se festa nacional da Bélgica.
A festa do Corpo do Senhor
Mas a difusão desta festa litúrgica só será completa no pontificado de Clemente V, que reafirma sua significação no Concilio de Viena (1311–1313). Alguns anos depois, em 1317, o Papa João XXII confirma o costume de fazer uma procissão, pelas vias da cidade, com o Corpo Eucarístico de Jesus, costume testemunhado desde 1274 em algumas dioceses da Alemanha.
O Concílio de Trento (1545–1563) vai insistir na exposição pública da Eucaristia, tornando obrigatória a procissão pelas ruas da cidade. Este gesto, além de manifestar publicamente a fé no Cristo Eucarístico, era uma forma de lutar contra a tese que negava a presença real de Cristo na hóstia consagrada.
Atualmente a Igreja conserva a festa de Corpus Christi como momento litúrgico e devocional do Povo de Deus. O Código de Direito Canônico (onde estão contidas as normas da Igreja) confirma a validade das exposições públicas da Eucaristia e diz que principalmente na solenidade do Corpo e Sangue de Cristo, haja procissão pelas vias públicas (cf. cân. 944).
Dessa forma, a festa foi crescendo cada vez mais, e outros bispos faziam a mesma coisa em sua diocese. Tomou tal proporção, que veio a tornar-se não só uma festa do território da Bélgica, mas sim de todo o mundo. Sendo que, a festa mundial de Corpus Christi foi decretada oficialmente somente, em 1264, seis anos após a morte de irmã Juliana, em 1258, com 66 anos.
Na cela onde jazia, foi exposto o Santíssimo Sacramento e, segundo as palavras do seu biógrafo, Juliana faleceu contemplando, com um ímpeto de amor, a Jesus Eucaristia, por ela sempre amado, honrado e adorado.
Santa Juliana de Mont Cornillon foi canonizada, em 1599, pelo Papa Clemente VIII. Como vimos, ela morreu sem ver a procissão de forma mundial.
Depois da morte do Papa Alexandre IV, foi eleito o novo Papa, o cardeal Jacques Panteleón. Naquela época, a corte papal era em Orvieto, um pouco ao norte de Roma. Muito perto dessa localidade fica a cidade de Bolsena, onde, em 1264, aconteceu o famoso Milagre de Bolsena.
Em que consiste esse milagre? Um padre da Boemia, Alemanha, que tinha dúvidas sobre a verdade da transubstanciação, presenciou um milagre. Durante uma viagem que fazia da cidade de Praga a Roma, ao celebrar a Santa Missa na tumba de Santa Cristina, na cidade de Bolsena, Itália, no momento da consagração, viu escorrer sangue da Hóstia Consagrada, banhando o corporal, os linhos litúrgicos e também a pedra do altar, que ficaram banhados de sangue.
O sacerdote, impressionado com o que viu, correu até a cidade de Orvieto, onde morava o Papa Urbano IV, que mandou a Bolsena o Bispo Giacomo, para ter a certeza do ocorrido e levar até ele o linho ensanguentado. A venerada relíquia foi levada em procissão a Orvieto em 19 junho de 1264. O Pontífice foi ao encontro do Bispo até a ponte do Rio Claro, hoje atual Ponte do Sol. O Papa pegou as relíquias e mostrou à população da cidade.
O Santo Padre, movido pelo pelas visões de Santa Juliana, pelo prodígio e também a petição de vários bispos, fez com que a festa do Corpus Christi se estendesse por toda a Igreja por meio da bula Transiturus de hoc mundo, em 11 de agosto de 1264. Esses fatos foram marcantes para se estabelecer a festa de Corpus Christi.
A morte do Papa Urbano IV, em 2 de outubro de 1264, um pouco depois da publicação do decreto, prejudicou a difusão da festa. Mas o Papa Clemente V tomou o assunto em suas mãos e, no concílio geral de Viena, ordenou mais uma vez a adoção desta festa. Em 1317, foi promulgada uma recompilação das leis por João XXII e assim a festa foi estendida a toda a Igreja.
Foi assim que a festa de Corpus Chisti aconteceu, tendo como testemunho estes dois fatos: as visões de Santa Juliana e o milagre eucarístico de Bolsena.
Santo Tomás de Aquino e a celebração do Corpo de Cristo
Santo Tomás de Aquino destacava três aspectos teológicos centrais do sacramento da Eucaristia. Primeiro, a Eucaristia faz o memorial de Jesus Cristo, que passou no meio dos homens fazendo o bem. Depois, a Eucaristia celebra a unidade fundamental entre Cristo com sua Igreja e com todos os homens de boa vontade. Enfim, a Eucaristia prefigura nossa união definitiva e plena com Cristo, no Reino dos Céus.
A Igreja, ao celebrar este mistério, revive estas três dimensões do sacramento.
Por isso envolve com muita solenidade a festa do Corpo de Cristo. Não raro, o dia de Corpus Christi é um dia de liturgia solene e participada por um número considerável de fiéis (sobretudo nos lugares onde este dia é feriado).
Salve Maria!
Referências
- Suma Teológica Art 3, questão 74, da matéria específica da Eucaristia.
- História da Igreja Católica Cap. Sobre a Solenidade de Corpus Christi
- Canção Nova Diac. Elenildo a origem do Corpus Christi
- Padrepauloricardo.org/a solenidade do Corpus Christi